Rodrigo Guéron
As medidas de afastamento social meia bomba, cheias de idas e vindas, adotadas pela maioria dos prefeitos e governadores acabam por fortalecer o discurso de Bolsonaro. O número de mortes segue altíssimo -- mesmo que em um "platô mais baixo" -- e, só para alguns exemplos, a ocupação das CTIs voltaram a subir em São Paulo e existe uma fila grande para vaga em CTIs em Curitiba. No entanto, Bolsonaro seguirá dizendo que os prefeitos e governadores fizeram lockdown (o que de fato pouquíssimos fizeram) e que este seria o motivo da economia que ir mal, das falências e do desemprego. A propósito, tratar todos os prefeitos e governadores em um só pacote, como insistem em fazer as pesquisas (e talvez até eu tenha feito no título deste texto) também é, de certa forma, cair na lógica do bolsonarismo.
Bolsonaro está jogando em um isolamento político parcial, seguro na sua base, e celebrando o distanciamento social mal feito, para vir com tudo ano que vem. Isso porque a maioria da população estará finalmente vacinada, depois de dezenas de milhares mortes -- ou centenas de milhares -- que poderíamos ter evitado. Assim, ainda que por um movimento de descompressão, a economia pode voltar a ganhar fôlego, o desemprego vai tender a cair e ele vai poder resgatar o seu discurso sobre a pandemia. É verdade que uma suposta recuperação econômica, ou uma recuperação da popularidade de Bolsonaro -- ambas ou umas das duas --, por uma série de motivos, podem simplesmente não acontecer. Mas esta é, na minha opinião, a aposta do bolsonarismo nesse momento; uma aposta em um cenário que me parece possível.
Em um país onde a morte e a violência são mais do que naturalizadas, isto é, são glorificadas, constituem todo um setor da economia, um mercado, uma subjetividade social e são elementos de excitação político-libidinal, não sei até que ponto terá eficácia política ficarmos chamando o genocida de genocida, sobretudo se tivermos a economia voltando a girar em 2022. Por outro lado, creio que não devamos jamais de deixar de combatê-lo como um criminoso que é. Como tenho insistido, até em um sentido mais pragmático, a luta contra o bolsonarismo nos impõe que tenhamos que encontrar um modo de se contrapor ao que tenho chamado de economia-política da violência e da morte, sobretudo porque a gente se depara de fato com ela todos os dias.
Em todo o caso, o que tiro de estratégia política dessa minha reflexão -- ainda que siga tendo muitas dúvidas e incertezas -- é que precisamos aumentar a pressão contra Bolsonaro agora, tentar forçar o seu impeachment (mesmo que nesse exato momento as condições estejam bastantes desfavoráveis) e, se possível, não deixar ele chegar até a eleição. É verdade que as pesquisas amplamente favoráveis a Lula e o fato dele estar livre e com seus direitos políticos recuperados são uma alegria, indicam uma situação política melhor do que há alguns meses atrás -- se alegrar e celebrar cada vitória nos faz mais fortes -- mas não podem nos iludir nem nos paralisar. Haverá muita luta ainda contra os fascistas e, pelo menos por enquanto, não parece que vai ser fácil.
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